A suspensão do leilão de concessão das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, da CPTM, que deveria ter ocorrido nesta terça-feira, 2, não causou surpresa diante da complexidade do edital proposto pelo governo do estado.
Com inúmeras atribuições, o futuro operador dos dois ramais terá que modernizar e reconstruir estações, encomendar 34 novos trens, entregar novas áreas de manutenção e equipamentos para a CPTM em lugares distintos aos que compreendem a concessão e também estar preparado para uma possível extensão do serviço até a região de Sorocaba, do qual não faz absoluta ideia do que se trata.
Por tudo isso, a decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE) de suspender a licitação após aceitar os argumentos do escritório de advocacia Fabichak & Bertoldi, parecia apenas uma questão de tempo. A gestão Doria ainda tentava levar o certame à frente mesmo com um volume imenso de questionamentos e dúvidas (e que até a publicação desse texto somava 764 perguntas) e de outras duas outras tentativas de impugnação, pela Federação Nacional de Seguros e pela empresa CS Brasil.
Embora o projeto tenha sido discutido por muitos anos e passado por uma longa consulta pública, repassar duas linhas de trens metropolitanos e que operam em vias construídas há décadas é uma tarefa hercúlea e que envolve inúmeros riscos aos interessados.
Não há como comparar a extensão de obrigações da concessionária com o que a ViaQuatro e a ViaMobilidade assumiram quando passaram a operar as linhas 4-Amarela e 5-Lilás do Metrô, dois projetos novos e com escopo bem mais claro – e que ainda assim motivam discussões sobre reequílibrios de contratos.
Tarefas para a CPTM
Ao propor o repasse à iniciativa privada de dois dos mais importantes ramais da CPTM, o governo do estado parece buscar uma solução única para vários problemas e talvez seja isso que torna o certame tão imprevisível. A compra de 34 trens, por exemplo, visa justamente ampliar a frota da CPTM em outras linhas que continuarão sob sua responsabilidade.
No entanto, como esse tipo de encomenda não é do tipo “pronta-entrega”, será preciso realizar um complicado rodízio de composições para que as linhas 8 e 9 sigam em operação enquanto os novos trens são fabricados. A gestão Doria também colocou no colo da futura concessionária a recuperação de duas composições avariadas e hoje fora de serviço.
A parte de sistemas é outra incógnita, com modernização já iniciada pela CPTM e cuja conclusão dependerá de fatores não controlados pela concessionária. Ao mesmo tempo, a implantação do sistema de sinalização CBTC ficou a cargo do parceiro privado.
No edital há também a exigência de a concessionária assumir uma tarefa delicada, a de recriar áreas de manutenção hoje reunidas no pátio Presidente Altino, em Osasco, em outras unidades da CPTM a fim de liberar o local para ampliar e modernizar sua própria infraestrutura de reparo nos trens. Ou seja, a futura parceira privada terá a incumbência de concentrar parte dos seus trabalhos em serviços que não são da natureza de uma concessão do tipo.
Serviço até Sorocaba
Outro ponto polêmico do edital diz respeito à inclusão de uma cláusula que obriga a operadora a oferecer o atual serviço em possíveis extensões na região metropolitana de São Paulo e Sorocaba. Foi esse o motivo que fez a empresa CS Brasil pedir a impugnação do edital, alegando que embutir o trecho entre Itapevi e Sorocaba traz uma imensa insegurança à concessão.
O edital pouco explica essa possibilidade, apenas prevê que se o governo decidir recuperar as vias e implantar estações no futuro, a concessionária será obrigada a oferecer o serviço. Embora não citado diretamente, o trecho refere-se ao Trem Intercidades, mas o contrato não estipula que a empresa que assumir as linhas 8 e 9 também será instada a operar esse serviço regional.
A Procuradoria Geral do Estado considerou o pedido de impugnação sem justificativa e recomendou seu indeferimento alegando que o contrato é claro em apenas prever que a concessionária terá de operar as linhas 8 e 9 em potenciais extensões além de existirem mecanismos para ajustar a parceria em caso de necessiadade de investimentos.
No entanto, ao prever que as atuais vias da Linha 8-Diamante possam receber outros serviços a serem operados no futuro, o governo cria uma situação de imprevisibilidade a despeito de existirem cláusulas que garantam receitas financeiras para a vencedora. Não se sabe, por exemplo, qual o impacto que essas intervenções podem causar no funcionamento da infraestrutura existente atualmente.
Aliás, esse é outro aspecto que pode causar receios, o fato de que a demanda dessas linhas, sobretudo a 9-Esmeralda, estar atualmente bem abaixo do período pré-pandemia. Desconhece-se até o momento qual será a situação dos dois ramais quando a vida voltar ao normal.
Edital dentro da lei
Para o governo do estado, o edital é bastante seguro e bem pensado. Em post no Twitter, o secretário dos Transportes Metropolitanos, Alexandre Baldy, garantiu a “legalidade do edital” e que o governo comunicará “todos os passos com transparência para que não existam prejuízos aos interessados e, sobretudo, à população”, em referência à suspensão do certame pelo TCE.
Uma mudança importante na modelagem foi a de abrir a concessão para mais empresas, reduzindo a obrigatoriedade de que os consórcios tenham de comprovar experiência em operação do gênero. Para a gestão Doria, o expertise pode ser terceirizado pela concessionária, assim será possível atrair mais competidores e consequentemente criar uma disputa maior pelo ativo da CPTM. Entretanto, essa opção é um dos aspectos reclamados pelo escritório de advocacia junto ao TCE.
Fato é que uma concessão como essa, com previsão de investimentos de R$ 3,2 bilhões e longa duração (30 anos), precisa ser a mais clara possível a fim de evitar um mau serviço no futuro e até mesmo a desistência por parte do vencedor caso as condições de operação das duas linhas não corresponda às previsões.
É claro que sendo um negócio como qualquer outro existe o risco, mas uma concessão pública não é uma atividade em que se pode simplesmente fechar as portas e assimilar os prejuízos. Milhares de pessoas dependem dos dois ramais diariamente e não podem ver o acesso a eles ameaçado. Que o diga as concessões sobre trilhos realizadas pelo governo do Rio de Janeiro e que correm sérios riscos de ficarem pelo caminho.
é o que venho dizendo faz tempo aqui neste site: não é necessidade nenhuma em fazer concessão dessas duas linhas. nenhuma!
e também venho dizendo que esta concessão terminará no tapetão, apesar que entendo que acabe saindo, mais cedo ou mais tarde, pois o poder judiciário estadual é fechado com o executivo. as verbas volumosas que o judiciário recebe, enquanto o restante passa por contingencia é a prova disso.
sobre as obrigações da contratada, apesar das duvidas e das lamentações, é mamão com açúcar. se não fosse, não teria vários interessados e brigas na justiça, se estão brigando é porque é um negocio da china. vejam só: 3,2 bilhões de investimento em 30 anos (media de 30 milhões por ano), clausula covid-19 que garante pagamento pela demanda de 1 milhão de usuários/dia, garantia de lucro de 12 bilhões no mínimo nos 30 anos de contrato baseado em informações do próprio edital, sem contar que as linhas 8 e 9 são as mais modernas da CPTM em todos os sentidos. os caras querem mais o que, pegar uma baba dessas e ainda não fazer nada? querem ganhar para operar mas não querem investir em nada? aí fica difícil.
sobre o TIC até Sorocaba, isso foi um adorno que o secretario colocou no pacote para dar satisfação a sua própria afirmação de que o TIC até Sorocaba estaria na concessão. na pratica, isso é mesma coisa que nada, só para inglês ver, para não ficar feio após afirmar que a concessão iria viabilizar o TIC até Sorocaba.
nem o TIC até campinas vai sair, quanto mais esse de Sorocaba que é muito mais complexo e que tem uma demanda baixíssima segundo estudos da própria CPTM (cerca de 25 mil usuários/dia). esquece, se esse é o motivo para alguém ficar preocupado para não entrar no leilão, pode ficar sossegado …