Não bastasse ter duas licitações paralisadas por conta de recursos de empresas desclassificadas, o Metrô de São Paulo continua a brigar na Justiça contra o Consórcio Monotrilho Integração, que foi o responsável original pela implantação da Linha 17-Ouro do monotrilho. Formado pelas construtoras Andrade Gutierrez e CR Almeida e pela fabricante Scomi, o CMI foi afastado pelo Metrô no ano passado após não ter cumprido o cronograma da obra, muito menos terminar um dos 14 trens encomendados.
A rescisão do contrato motivou a companhia a aplicar uma multa de R$ 88 milhões ao consórcio além de proibi-las de serem contratadas pela administração pública do estado por um período de dois anos. Ocorre que o consórcio move uma ação contra o Metrô desde o final de 2015 e que ainda corre na Justiça, onde reclamam que foram impelidas a seguir à frente do projeto sob ameaça de retaliações. As empresas ainda argumentaram que o contrato foi quebrado pelo Metrô quando suspendeu as fases 2 (Aeroporto-Jabaquara) e 3 (Morumbi-São Paulo-Morumbi) da Linha 17, além de atrasos em desapropriações e licenças.
Esse processo permanece na fase em que estão sendo produzidos laudos periciais para esclarecer o que foi entregue de fato e a que preço no projeto. Antes disso, já houve acordos entre as empresas para retomada das obras, mas no fim o consórcio desmobilizou os canteiros até que fosse afastado pelo Metrô em 26 de abril do ano passado, quando a companhia assinou um termo de rescisão unilateral. Na época, a Scomi já havia entrado em processo de falência na Malásia e abandonado os trabalhos de seu escopo, que envolviam a entrega de trens e sistemas.
Agora, o CMI entrou com nova ação de tutela de urgência para impedir que o Metrô aplique as sanções anunciadas no ano passado. Curiosamente, a nova ação inclui também a empresa MPE, que havia deixado a sociedade há anos. No pedido na Justiça, elas solicitam que o pgamento da multa seja suspensa assim com a inclusão do débito na dívida ativa até que a primeira ação seja julgada em definitivo. No entanto, a juíza Maricy Maraldi indeferiu o pedido alegando que nesses casos deve “prevalecer, nesse momento, a presunção de veracidade e legalidade dos atos administrativos combatidos”.
Novela com final triste
O contrato para a implantação da Linha 17-Ouro do Metrô foi assinado em julho de 2011, mas as obras de fato só tiveram início um ano depois. O projeto previa um ramal com 17,6 km de extensão dividido em três fases e 24 trens de monotrilho, com custo de R$ 3,2 bilhões à epoca. A meta do governo Alckmin era de entregar o novo ramal até 2014 para servir como ligação metroviária com o estádio do Morumbi, então escolhido para sediar os jogos da Copa do Mundo. Como parte da matriz da Copa, o projeto teria quase metade do seu custo financiado pelo BNDES.
A obra acabou perdendo seu principal argumento quando a Fifa decidiu escolher a futura Arena Corinthians, no bairro de Itaquera, como sede do torneio em São Paulo. A gestão Alckmin, no entanto, manteve a Linha 17 como parte das obras para receber o evento, alegando que ela facilitaria o deslocamento de turistas do Aeroporto de Congonhas à região hoteleira.
Logo também ficou claro que os prazos eram irreais à medida que problemas de gestão começavam a surgir como falta de projetos, desapropriações e licenciamentos. A linha também sofreu com polêmicas como a de moradores dos bairros que receberiam as vias elevadas. Outro foco de problemas foi o Cemitério do Morumbi, onde o ramal passaria ao largo, além de um condomínio construído por um trecho onde deveria ser alargada a avenida que receberia as colunas.
Se não bastasse isso, a prefeitura de São Paulo, que deveria implantar avenidas na região do Jabaquara e do Morumbi, não conseguiu seguir com o projeto, além da dificuldade em realocar moradores de áreas sensíveis por onde passaria a linha. Com a crise econômica que se instalava no país, o governo do estado optou por congelar as fases 2 e 3.
Na fase 1, no entanto, também existiam problemas, como o fechamento da ciclovia da Marginal Pinheiros. Com o protesto dos ciclistas, foi preciso construir uma nova ciclovia na outra margem do rio a toque de caixa e que permanece ativa até hoje. As obras civis também enfrentaram imprevistos como os trabalhos dentro do piscinão da avenida Roberto Marinho e a queda de uma das vigas-trilho que vitimou um funcionário e paralisou os trabalhos por meses.
Nessa época, Andrade Gutierrez e CR Almeida, que também haviam vencido outra licitação para construir quatro estações, já mostravam o desejo de deixar o projeto, uma situação que acabou se arrastando por muito tempo e criando os problemas que até hoje afetam o ramal.
O cenário nos próximos anos continua incerto. Se a obra da estação Morumbi, tocada pela Camargo Correa, deverá ser entregue neste ano, o restante do projeto não tem data para ser concluído, embora a gestão Doria insista em estimar 2022 como ano de inauguração. Pesam conta qualquer projeção o fato de as duas licitações lançadas após a rescisão com o consórcio Monotrilho Integração estarem paralisadas.
Enquanto a Constran teve a assinatura do contrato de obras civis remanescentes barrado pela Justiça, a BYD ainda não assumiu oficialmente o projeto de sistemas e trens de monotrilho após ser apontada como vencedora da licitação. Isso pode ocorrer nas próximas semanas, porém, há o risco de os consórcios derrotados também apelarem para a Justiça para impedir isso. Ou seja, a Linha 17-Ouro tem hoje mais novidades nos tribunais do que nos canteiros de obras.