Encomenda de trens novos para linhas 8 e 9 pode chegar a 36 unidades

A 7ª rodada de questionamentos da concessão das linhas 8 e 9, atualmente suspensa, trouxe a possibilidade de a concessionária entregar mais duas composições em vez de recuperar dois trens avariados
Manutenção de trens estão em foco nessa rodada (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Apesar da paralisação da concessão das linhas 8 e 9 da CPTM por parte do Tribunal de Contas do Estado, adiando o certame por período indeterminado, continuamos a realizar as análises dos principais questionamentos elaborados pela empresas interessadas em assumir a operação desses ramais. É por meio deles que podemos averiguar detalhes do contrato e medir até que ponto o edital está alinhado com as expectativas de mercado.

Questionamentos

Iniciamos a apuração dos questionamentos com perguntas relativas às revisões de nível F que deverão ser realizadas pela concessionária nos trens da série 7000 e 7500, ambos produzidos pela fabricante espanhola CAF. A empresa interessada questiona se a CPTM entregará todos os trens que atingiram a quilometragem limite, no caso 1,2 milhão de quilômetros rodados, com suas revisões realizadas em dia. Como já se sabe, a questão contraria o que está disposto no edital onde a concessionária é responsável por todas as atuações relativas às revisões de nível F nos trens das séries 7000 e 7500. O governo esclareceu que, para os trens da série 7000, 12 composições serão entregues com a RF finalizada e, no caso dos trens da série 7500, 2 trens receberão as manutenções programadas. Cabe citar que haverá equilíbrio-econômico financeiro em favor do Poder Concedente, ou seja, ressarcimento ao poder público, devido a realização dessas manutenções pelas equipes que atuam pela CPTM.

Em relação aos sistemas e aos trens, houve questionamentos relativos a inspeções de segurança e também de ensaios em determinadas peças. O governo esclareceu que as mudanças que estão previstas no sistema de sinalização, domínio 2 da Linha 8 – Diamante, assim como em alguns equipamentos em trens, deverão passar pela análise de segurança SIL-4 como forma de atestar sua confiabilidade em relação às falhas que possam vir a ocorrer. Da mesma forma, no caso dos trens novos, os equipamentos deverão passar por ensaios de rotina e de tipo, de forma a constatar a confiabilidade do material que está sendo adquirido

Uma indagação buscou trazer esclarecimentos em relação a outro aspecto do sistema ATO. A questão levantou se a CPTM seria responsável por realizar a instalação do equipamento dentro dos trens que ainda não possuem o sistema embarcado. A resposta foi positiva: a CPTM será responsável pelo complemento do sistema ATO ao instalar os equipamentos nas composições remanescentes. Cabe ressaltar que a concessionária deverá ceder os trens e os acessos na Linha 9 para as atividades de comissionamento.

Sobre os trens novos ou os que venham a ser remobilizados, surgiram novas informações. Uma das proponentes questionou sobre o prazo para entrega de dois novos trens caso seja viabilizada a baixa operacional das duas composições da série 7000 que hoje se encontram em precário estado de conservação. Segundo o governo, a concessionária deverá realizar a entrega de duas novas composições substitutas no 31º mês da concessão e operá-las até o 34° mês, ou seja, esses novos trens poderiam ser entregues após o cumprimento obrigatório da compra dos 34 novos trens.

Houve também questionamento a respeito da remobilização dos trens avariados. A proponente pergunta sobre as peças utilizadas como sobressalentes. Como a CPTM dispõe de equipamentos para os trens que ainda estão em operação nas demais linhas, ela poderia ceder parte desses itens para ajudar no processo de remobilização do material rodante. O governo indicou que o entendimento da empresa estava incorreto e de que a CPTM não vai ceder qualquer item sobressalente para a remobilização dos trens com exceção de 16 truques que serão entregues para a concessionária. Sobre os sistemas embarcados do trem e demais informações técnicas, o governo informou que todas as demais peças, inclusive sistemas operacionais (COSMOS) deverão ser adquiridos da fabricante CAF. Tambem orientou acerca da disponibilização de documentação técnica, que se restringe apenas para a realização das manutenções nos trens e não contempla os projetos de fabricação propriamente ditos. Todos esses documentos deverão ser fornecidos pela fabricante espanhola CAF caso a futura concessionária opte por realizar a remobilização dos trens.

Composição Q008 acidentada, choque de trens ocorreu em julho/2011 (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Outro ponto que também foi alvo de questionamento é a convivência entre CPTM e concessionária no Pátio de Presidente Altino. Segundo a resposta a um dos questionamentos a CPTM irá realizar algumas atividades no Pátio mesmo após a formalização do processo de concessão. Essas atividades são mais voltadas para a área de manutenção eletroeletrônica e mecânica, mas sem contemplar a manutenção dos trens. A única exceção ficará para o torno de rodas que deverá ser compartilhado entre a concessionária e a CPTM, portanto, até que a empresa privada faça a instalação do novo torno de rodas no Pátio de Engº São Paulo a CPTM poderá utilizar o equipamento que hoje está presente em Presidente Altino.

Outro ponto também relativo às dependências do pátio de Presidente Altino é em relação às sucatas ou entulho que possa vir a ser encontrado. Segundo o governo, todo entulho, tóxico ou não, deverá ser descartado pela concessionária conforme manda a legislação. Cabe lembrar que entre os itens que não estão contemplados na concessão estão alguns carros ferroviários como um carro cabine da antiga série 5000 doado para a ABPF, porém não retirado, e duas composições da série 4800, sendo uma delas em fase de tombamento pelo CONDEPHAAT. A questão pode sugerir que esses materiais possam vir a ser realocados para outras dependências da CPTM. Quanto ao trem japonês da série 4800, por possuir bitola métrica, ou seja, um espaçamento de 1 metro entre as rodas, seu traslado pode ser dificultado uma vez que as linhas da CPTM operam apenas com a bitola de 1,60 m. Como é um item que não pode ser descartado devido à proteção patrimonial, caso as vias em bitola mista da Linha 8-Diamante entre Presidente Altino e o restante da malha da CPTM possua algum tipo de descontinuidade, o trem deverá ficar no pátio ou ser realocado através de operação especial.

Composição da Série 4800 que está protegida em vista de seu processo de tombamento (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Uma questão extremamente relevante se refere a uma possível modernização do sistema de sinalização nas linhas. Segundo o esclarecimento do governo estadual, caso as linhas atinjam um carregamento superior à 40 mil passageiros por hora-sentido deverão ser executadas obras de melhoria no sistema de sinalização. Umas das empresas interessadas questionou sobre a penalização durante as obras de modernização desses sistema. Ainda no esclarecimento, o governo explicou que a concessionária deverá cumprir os requisitos operacionais dispostos em contrato, podendo ser penalizada caso haja descumprimento de qualquer normativa de operação.

Uma dessas diretrizes é a de atrasos graves. Segundo o governo, a concessionária deverá montar seu próprio planejamento de operação que deverá ser alvo de fiscalização. Caso exista algum atraso dentro do que foi proposto pela parceira privada dentro do seu plano de operação poderá haver penalidades. A gravidade das penalidades pode variar entre os graus de admissível, leve ou grave.

Um questionamento preocupante se refere ao conhecimento técnico que será repassado da CPTM para a concessionária. A questão envolve a possibilidade da penalização da empresa por não absorver conhecimento técnico. Absolutamente é uma questão que gera, no mínimo, estranheza só por cogitar vício na transferência de conhecimento, comprometendo não só a operação como a manutenção, e consequentemente a segurança de milhares de pessoas. O governo foi claro em dizer que, apesar de poder contar com uma operadora subcontratada, a concessionaria deverá absorver todo o conhecimento técnico necessário para operar as linhas de forma plena e segura.

Sobre o projeto da reconstrução da estação Ambuitá na extensão operacional da Linha 8-Diamante. Uma das empresas questionou a possibilidade de realizar alterações no projeto da estação mudando o estilo da construção, proposta com plataformas centrais, para plataformas laterais. O governo indicou a questão de forma positiva, dessa forma a concessionária poderá realizar alterações nos projetos desde que cumpra os requisitos mínimos para garantir uma operação segura e eficiente na estação de Ambuitá.

Local onde será reconstruída a Estação Ambuitá (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Ainda falando sobre as estações, houve um esclarecimento sobre intervenções nas estações. O governo afirmou que todas as plataformas que estão com coberturas irregulares deverão passar por uma correção de forma que toda a plataforma esteja coberta. Foi indicado também que essa cobertura deverá se restringir no mínimo para as áreas onde os trens realizam suas paradas.

Uma das empresas interessadas verificou a existência de “vícios graves” em alguns pontos da área da concessão. Em visitas técnicas, uma das empresas relacionou problemas em uma série de locais sendo eles as subestações de Osasco, Presidente Altino, Morumbi, Imperatriz Leopoldina, Cabine Ceasa, Cabine Santo Amaro, Cabine Jurubatuba e Cabine Grajaú. Em todos esses locais foram constatadas “irregularidades” que segundo a empresa podem “(i) representar um passivo/vício/defeito existente antes da assunção dos serviços pela Concessionária; (ii) constituir risco à segurança, à confiabilidade e à disponibilidade dos ativos; e (iii) impactar a performance operacional da Concessionária”. O governo esclareceu que todas as irregularidades deverão ser sanadas pela concessionária, pois, será atribuída a ela em contrato a modernização do sistema de energia elétrica.

Alguns problemas mais sérios foram constatados em estações como Presidente Altino e Osasco que estavam com a central de detecção de incêndio totalmente inoperante. Vale lembrar que pode-se caracterizar como negligência por parte da CPTM a não manutenção dos seus sistemas de segurança, podendo colocar a risco a integridade dos passageiros. É necessário ressaltar mais uma vez: é importante que haja investimento em modernização dos sistemas de proteção pela concessionária, mas isso jamais deverá justificar a total ausência do funcionamento de sistemas que podem salvar vidas em casos emergenciais.

Equipamentos de combate à incêndio são imprescindíveis para situações emergenciais (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

Por fim, temos um dos questionamentos mais intrigantes de toda a bateria de perguntas. Segundo a empresa interessada, durante uma visita à estação Osasco foi constatada a existência de diversas goteiras na estação, o que poderia ser caracterizado como vício, comprometendo a segurança e confiabilidade dos ativos e também, surpreendentemente, impactar na performance operacional da concessionária. Apesar de tamanhos danos que uma goteira pode causar para a operação de uma concessionária de trens metropolitanos, o governo esclarece que o grave vício constatado deverá ser sanado pela concessionária no plano de modernização das estações.

Conclusão

Apesar de ser um projeto muito amplo e aguardado por parte do mercado, a concessão das Linhas 8 e 9 certamente bateu todos os recordes de questionamentos. Afinal de contas, não se trata de uma concessão como as da linhas 4-Amarela e 5-Lilás que contam com tecnologia de ponta. A concessão se trata de linhas que ainda estão em franco processo de modernização e que precisarão passar por várias obras e mudanças para se atingir um padrão de plena excelência. A CPTM já fez muito pelas linhas que hoje são as mais regulares e bem avaliadas de sua malha, mas ainda é necessário muito mais para que toda essa rede seja otimizada ao nível “Metrô” de qualidade.

Gostaria de usar as considerações finais para relembrar mais uma vez que o que está em jogo na concessão não são apenas os interesses financeiros de grandes conglomerados que visam realizar uma operação superavitária, mas a vida de milhões de pessoas que serão afetadas diretamente, sejam como empregados, sejam como passageiros. Ter um olhar social para essa questão é muito importante. Para a CPTM cabe novamente falar infinitas vezes se forem necessárias: não se troca a segurança operacional por projetos de qualquer espécie. A ausência de do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros bem como a constatação por parte das empresas interessadas de não funcionamento da Central de Detecção de Incêndio de duas importantes estações, que inclusive são área de transferência entre as Linhas 8 e 9, constitui-se como irresponsabilidade e, até certo ponto, incúria das normas de segurança operacional.

Nunca devemos esquecer que “evitar acidente é o ponto de honra da empresa”. Segurança é o pilar que sustenta toda a operação de transportes sobre trilhos (e porque não dizer toda a nossa vida). Ela traz a integridade aos funcionários e confiança dos passageiros. Portanto, todas as ações que visam evitar acidentes, incluindo a renovação do AVCB, é sempre bem vinda e garante a CPTM a boa reputação que sempre teve.

“Evitar acidente é o ponto de honra da empresa” (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

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