Foram precisos nada menos que 47 dias para que o Metrô de São Paulo analisasse e decidisse sobre os recursos administrativos da licitação de sistemas da Linha 17-Ouro movidos pelos consórcios concorrentes Signalling e CQCT. E a companhia negou ambos, abrindo caminho para a homologação da BYD como vencedora do certame que irá fornecer os 14 trens de monotrilho do ramal da Zona Sul de São Paulo, além de sistemas e equipamentos auxiliares.
O processo de licitação está paralisado desde o dia 7 de fevereiro quando as duas empresas que foram desclassificadas entraram com os recursos, quase uma semana após o Metrô anunciar a BYD como classificada.
Como mostrou o site na época, a Signalling fez a proposta de menor valor, porém, teve vários pontos de sua proposta considerados insuficientes para habilitá-la, como patrimônio público inferior ao exigido e falta de comprovação técnica de experiência na parte de sistemas. Segunda colocada, a BYD foi então chamada para comprovar os detalhes da sua proposta enquanto a CQCT, com a proposta mais cara, foi deixada de lado.
As duas, entretanto, insinuaram que o Metrô havia dado tratamento diferenciado para a BYD, facultando a ela uma visita técnica e aceitando documentos que em tese não seriam suficientes para comprovar sua experiência. A Signalling afirmou ainda que a concorrente não tinha patrimônio suficiente em uma das sócias do consórcio. O departamento jurídico do Metrô, após ouvir as áreas envolvidas na licitação, divulgou sua análise e decisão, argumentando ponto a ponto as reclamações das concorrentes.
Signalling
O consórcio, formado pelas empresas T´Trans, Bom Sinal e Molinari, afirmou que o Metrô não realizou diligências in loco como na BYD, mas a companhia alegou que elas são facultativas, e poden não ser realizadan, mesmo se recebido convite. O Metrô explicou que visita à linha informada como referência para atestar experiência da Signalling não faria sentido já que “a operadora da linha Ampag Line e a Thales não declaram ou reconheceram a participação do apresentado pelo consórcio Signalling”. A empresa ainda tentou apresentar outro projeto em Dubai, mas o Metrô ignorou por considerar que essa alternativa não fazia parte da proposta formal.
Sob as regras seguidas pelo edital, o Metrô argumentou que a licitação seguiu a Lei 13.303/16, a chamada “Lei das Estatais”, e não a Lei 8.666/93, que rege as licitações públicas. Por isso não julgou as propostas em fases, o que pedia a Signalling, e sim em apenas uma fase. Além disso, o consórcio tentou se qualificar apenas por aptidão técnica, quando há apenas o reconhecimento simples de condições de executar um serviço, e não capacitação técnica, o que o Metrô exigiu nas regras do edital..
A companhia ressaltou que funcionários designados para fazer a diligência na fábrica da BYD estavam na China meses antes da visita, em curso de especialização, por isso puderam se deslocar rapidamente até o local, explicou.
Sobre o patrimônuo líquido, a Signalling afirmou que a soma de seus sócios seria de R$ 130 milhões, acima dos R$ 127 milhões exigidos pelo edital, mas o Metrô alegou que soma é proporcional à participação na sociedade e portanto de apenas R$ 53 milhões. Já o patrimônio líquido da BYD, de R$ 5 bilhões, embora bem superior ao mínimo exigido, colocava uma das sócias, a BYD Signal & Comunication, com patrimônio inferior. O Metrô explicou que o consórcio como um todo atendeu ao edital, mas ressaltou que deixou de utilizar os balanços de 2019, que traziam uma situação mais cômoda, pela certeza de que os dados de 2018 não trariam prejuízos, a fim de manter todos os dados no mesmo ano.
CQCT
No caso do consórcio CQCT, liderado pela Chongqing CRRC, da China, a empresa reclamava não ter sido citada na decisão que elegeu a BYD vencedora. Para o Metrô, esse aspecto não era necessário já que a proposta foi a de preço mais elevado e portanto não avançou no certame. A companhia citou como justificativa para a ausência do CQCT em fevereiro por conta do “alto custo” das publicações no Diário Oficial em que “publica somente o necessário”.
Assim como a Signalling, o CQCT também reclamou da suposta falta de transparência nas decisões, o que o departamento jurídico do Metrô contestou ao reafirmar se tratar de fase recursal única, portanto, não haveria porque divulgar decisões parciais. A concorrente chinesa também havia estranhado a rapidez com que a companhia fez a diligência na China, o que o Metrô explicou novamente ter sido motivada pela presença dos representantes no país, inclusive um deles o responsável por elaborar as especificações técnicas dos trens.
O CQCT também pediu diligências in loco para verificar sua tecnologia, porém, os advogados da companhia reforçaram o fato de que isso só é necessário em situações específicas, quando a visita pode esclarecer dúvidas que os documentos não conseguem.
A concorrente chinesa também se ateve ao fato de que a BYD não atenderia aos requisitos por não atestar explicitamente experiência com o mesmo tipo de serviço/produto do edital, como certificado fornecido pela autoridade reguladora da região onde o sistema foi implantado. Novamente, o Metrô considerou os argumentos imprecisos e acrescentou que o edital também não exige que a empresa seja uma “operadora profissional”, em referência ao fato de uma das linhas de monotrilho da BYD estar em sua própria fábrica.
O CQCT reclamou ainda que alguns atestados foram emitidos por empresas do próprio grupo BYD, porém, o Metrô explicou que não há nenhuma restrição ao emissor deles. Outra alegação foi a que a pequena linha dentro da fábrica não teria caráter comercial, mas mais uma vez a companhia contestou essa informação ao argumentar que o sistema possui bloqueios, inclusive por reconhecimento facial, e que tem características de uma operação normal.
O Metrô também não aceitou a alegação de que a linha da BYD não tem o grau de automação exigido, tendo comprovado a operação UTO (sem operador presente nos trens). Por fim, a reclamação e que a linha não atinge a “velocidade de operação” constante no edital foi contestada pelo Metrô por não ser parte das exigências técnicas.
Próximos passos
Se seguir o processo de praxe, o Metrô homologará a proposta da BYD Skyrail que então terá um período para providenciar documentos e abrir uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) para assumir o contrato. Com a assinatura formal, o prazo passaria a contar, porém, não será surpresa se as duas concorrentes optarem por levar o caso à Justiça.
Nesse caso, a licitação voltaria a ser paralisada até que houvesse toda a análise dos argumentos dos envolvidos e a decisão em 1ª instância. E mesmo que ela seja favorável ao Metrô, há a hipótese de um dos derrotados entrar com um recurso em 2º grau. É o que está ocorrendo com outra licitação da Linha 17, a que envolve as obras civis e vencida pela Constran.
O certame continua parado na 2ª instância do Tribunal de Justiça de São Paulo por conta de recurso da construtora Coesa, que não aceita a escolha da rival, mesmo após ter seu recurso administrado negado pelo Metrô e ter sua ação julgada improcedente pela juíza Alexandra Fuchs de Araujo.
Como se nota, ainda parece distante o dia em que veremos os trens de monotrilho circulando na Linha 17 do Metrô.
Torço pra que as extensões da Linha 17 saiam do papel e que sejam com menos percauços do que este primeiro trecho.
A grande questão que vejo aqui é justamente um transtorno gigantesco que o Metrô enfrenta atualmente com a Linha 15 – Prata, que é o fato de ter adquirido composições de uma empresa que possui expertise no setor metro-ferroviário, mas que estava começando os trabalhos com monotrilhos. Isso é um transtorno imenso, seja para o Metrô, seja depois para repassar a concessionária que irá administrar o trecho, mas principalmente para a população que não consegue ter um serviço de qualidade sendo oferecido.
Creio que isso pesou muito para a decisão por uma empresa com muito mais conhecimento sobre o assunto, evitando possíveis aventureiros que depois venham a gerar problemas. Claro, isso não é uma garantia absoluta de que tudo vai dar certo e que a BYD será a melhor empresa do segmento ou coisa do tipo, mas é uma tentativa de minimização desses problemas.
Lucas A. Santo, considerando que a Bombardier projeta e fabrica monotrilhos desde 1968, nada do que você escreveu faz o menor sentido.