Opinião: PPP do Trem Intercidades ficou refém de grupos privados

Modelo de contrato que pretendia buscar investimento privado acabou distorcido para que estado assuma papel de fiador de grupos empresariais
PPP do Trem Intercidades contará com maior participação publica (Jean Carlos)
PPP do Trem Intercidades contará com maior participação publica (Jean Carlos)

Novos projetos metroferroviários estão exigindo cada vez mais investimentos e qualificação técnica para saírem do papel. A iniciativa privada, que deveria assumir o papel de protagonista, aparentemente, busca mais e mais ajuda do estado.

Diversas reclamações dos principais concorrentes ao projeto do Trem Intercidades Eixo Norte estão fazendo o governo rever sua posição para tornar o processo mais atrativo sob o pretexto de “segurança”. Alguns pontos de fato requerem maior cuidado, porém, outros são meramente subserviência.

Uma transição responsável

Dentre os aspectos que requerem maior cuidado está a fase de transição operacional. O foco aqui é evitar a operação precária como a que ocorreu no primeiro ano da concessão das Linhas 8 e 9 operadas pela ViaMobilidade.

Para isso uma série de ajustes foi realizada. O tempo de transição será aumentado de sete meses para um ano. O aluguel de equipamentos da CPTM permitirá uma passagem menos conturbada em termos de manutenção, o que não desfalcaria a linha da noite para o dia.

Transição alongada evitaria problemas como os vistos nas Linhas 8 e 9 (Jean Carlos)

Trens bancados pelo governo

A questão da demanda e tarifa do Trem Intercidades e Trem Intermetropolitano foram revistas. O site fez um artigo mostrando que o governo optou por uma lógica tarifária prejudicial ao passageiro no serviço metropolitano entre Jundiaí e Campinas que terá passagem mais cara, tirando o caráter social do serviço.

O TIC por sua vez será alvo de aporte estatal nas tarifas que poderá garantir receita de pelo menos R$ 13,5 bilhões. A incerteza e receio de uma demanda menor para o serviço expresso fizeram o estado atuar para, mais uma vez, tornar o serviço atrativo os investidores. O que deveria ser um modelo de negócio puramente privado, se tornará parcialmente financiado com dinheiro público.

Trens para Campinas terão apoio do estado (Jean Carlos/SP Sobre Trilhos)

PPP – Pouca Participação Privada

As solicitações de aumento no investimento público são praticamente inconcebíveis. Na revisão do projeto, o governo do estado poderá aportar 8,5 bilhões nas obras do Trem Intercidades, que inclui principalmente o investimento público na construção. Também poderá haver o recebimento da contraprestação pecuniária estimada em R$ 7,6 bilhões, que será paga mensalmente à operadora.

As sugestões da iniciativa privada eram de aumentar o valor de aporte público para até 80%. Isto é, basicamente, deixar a maior parte do investimento para o governo. Se a lógica da PPP é diminuir a participação do estado e aumentar a do privado, é um contra senso querer depender do governo na hora de colocar a mão no bolso.

Muleta técnica

Segundo informações do novo edital republicado, funcionários da CPTM serão cedidos por 180 dias para a nova operadora. A ideia é manter parte da experiência do pessoal que já atua na Linha 7-Rubi durante os primeiros meses da concessão.

O que pode ser visto como uma ajuda estratégica para facilitar o processo de transição, também pode ser interpretado como uma nítida incapacidade técnica de gerir e operar uma ferrovia.

As estatais mantém funcionários especializados durante muitos anos e, periodicamente, renova os quadros para formar aos poucos novos profissionais. Essa lógica permite a inserção de novos funcionários sem abrir mão da expertise dos antigos no curto prazo.

Quando um novo operador entra em cena, muitas vezes os profissionais mais experientes são demitidos, ora pela idade, ora pelo salários muito bem pagos. É preciso recorrer à um misto de profissionais com experiência prévia, geralmente que já trabalham nas estatais, e novos funcionários, boa parte sem conhecimento específico ferroviário. Isso pode impactar na qualidade dos serviços.

Funcionários da CPTM podem ter que trabalhar em linhas privadas (Jean Carlos)

Para além da própria fase de transição, onde os funcionários serão ensinados a operar o trecho, manter pessoal da CPTM na concessão como apoio técnico, além de ser constrangedor para o profissional que foi removido de seu local de trabalho, é lesivo ao estado, que deixará de contar com profissionais experientes nas demais linhas públicas. Apesar disso, a concessionária deverá ressarcir a CPTM pelo uso destes funcionários.

Conclusão

O relançamento do edital do Trem Intercidades é uma demanda exclusivamente da iniciativa privada. As revisões para tornar o projeto mais “atrativo” nada mais são do que o reflexo da subserviência do governo do estado perante a um setor privado completamente dependente do poder (dinheiro) público.

Diante de tal constatação questiona-se: para que serve uma PPP? Diferentemente do que se vê na Linha 6-Laranja, onde a iniciativa privada é posta em sua máxima potência, destravando um projeto de mobilidade relevante, determinados grupos querem ao máximo contar com as muletas do estado.

PPP da Linha 6-Laranja: Exemplo a atuação positiva da iniciativa privada (Jean Carlos)

O foco da PPP deveria ser justamente o oposto, o maior investimento privado para permitir que projetos urgentes saiam do papel com maior velocidade, atendendo a mais passageiros.

O exemplo do TIC Eixo Norte faz pensar se a iniciativa privada está mesmo temerosa em assumir uma concessão de risco ou se na verdade busca garantir um lucro fácil usando dinheiro público para isso.

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23 comments
  1. Só esperando o os defensores do indefensável aparecem, quero ver qual argumento vai ser usado pra defender esse troço ai. E lendo o começo da matéria, já da pra ver q o governador mentiu mais uma vez, daqui a pouco esse pinóquio esta com nariz de 2 metros

  2. Mais um ótimo artigo que analisa a realidade nua e crua daquilo que já percebemos a algum tempo: a inviabilidade das PPP’s pata o transporte sobre trilhos no modelo patrocinado pelo governo do Estado onde o foco, ao invés de ser o usuário do serviço, é voltado ao investidor que cobra do poder público o investimento e a garantia de retorno.
    Resumindo, parece óbvio como o investimento e operação ficam mais barato e simples com a própria CPTM tocando o serviço, garantindo assim a continuidade da função do social de transporte a preços módicos, sem a necessidade de malabarismos contratuais para agradar setores empresariais.
    Esperamos que a sociedade acorde antes que seja tarde demais!

    1. O problema é que esse projeto aí passa muito longe daquilo que seria uma PPP de verdade. Aliás, ele não tem praticamente nada de PPP.

    1. Comentário fraco Ivo, não apresentou nenhum argumento pra defender essa PPP, e nem pra sustentar a sua fala, de q o artigo é fraco

    2. e você como sempre defendendo a CCR com unhas e dentes. pq vc não cria um site e explica porque é a favor dessas concessões lesivas ao estado? vc está levando vantagem financeira com isso?

      e ainda não me respondeu sobre o subsídio de mais de 7 bilhões para as empresas de ônibus em sp, com menos ofertas de ônibus e viagem

      1. Se alguém souber pra aonde estão indo os subsídios às empresas de ônibus de São Paulo, por favor nos avise…
        Pela forma miserável como o sistema opera, não parece que esteja indo para os ônibus.

    1. E vc prefere dar o dinheiro dos seus impostos pra empresários enriquecerem, e no fim das contas, nem TIC vai ter.

      Aqui temos o conceito de uma pessoas, ALIENADA.

    1. Texto produzido por alguém sensato e que minimamente sabe fazer contas. Qual a explicação pra defender uma PPP onde o governo já garante a receita e vai entrar com 80% do valor do investimento?

  3. Justamente em um governo do estado, leia-se: Tarcísio de Freitas, q se diz “liberal”. Talvez seja “liberal” para os empresários “amigões”. E falavam mal do PSDB, o melhor período de governo da história de SP!!!! Aliás, o governo do Tarcísio tem sido bem sucedido enquanto permanece apenas mantendo aquilo que já tinha sido projetado pelo governo do PSDB. A PPP têm q ser com capital majoritariamente privado, pelo menos em 50%. É por isso q essa deveria ser uma concorrência internacional, deixar para o empresariado chapa branca desse país, dá nisso. Abra para concorrência internacional e verá posições de investimento privado até maiores q 50%, a não ser q isso não interesse ao “amigões” do Tarcisão!!

  4. O foco deste projeto deveria ser o transporte público e a logística, com a PPP tendo a missão de reduzir os custos e os riscos financeiros para o governo.
    Mas está ocorrendo exatamente o contrário: O foco do projeto passou a ser o retorno financeiro dos pretendidos investidores (que pouco irão investir), com o governo assumindo a maior parte dos custos e também os riscos financeiros. Não precisamos de “projetos” assim.

  5. Muito boa a observação. É lógico que a iniciativa privada não quer risco e já descobriu que a PPP é uma mina de ouro.
    Falar que o PSDB fez boa Parceria eu realmente acredito, principalmente para o grupo CCR. Tem que não querer enxergar que o Grupo em 10 anos de Linha 4 amarela ganhou as linhas 8 e 9 de brinde. Tem que ser muito burro para não perceber. A CCR recebe 74% a mais na passagem de metrô. Isso é um negócio de pai para filho.
    O mesmo grupo domina os pedágios das rodovias também feitas com o dinheiro só Estado. Nossos governantes tem tanto respeito por esse grupo que já estou imaginando que vão privatizar o judiciário e nomear magistrados oriundo do grupo, ou quem sabe criar um MP privado trocando o parquet por “promotores vindo do grupo CCR. Muito bom entregaremos tudo em PPP –

  6. Enquanto governo e parasitas negociam essa teta, a população de São Paulo está sofrendo com falta de segurança, saúde, educação etc. Já está mais do que claro que esse governo será um desastre e que chegou a hora da sociedade reagir antes que essa administração chegue ao nível de administrações locais terríveis do passado, como Fleury, Pitta etc

  7. Apoio a ideia de PPP para os trens metropolitanos, porém não apoio o governo estadual bancar mais que 20% do valor investido no projeto. O que aconteceu com a Via Mobilidade nas linhas 8 e 9, para mim, serve de exemplo para se tomar mais cuidado com as concessões das outras linhas operado pelo Metrô e CPTM, tendo as estatais atuando como fiscalizadoras dessas linhas para o que aconteceu nas linhas 8 e 9 não se repita.

  8. COMO SE PODE CRITICAR O ATUAL GOVERNO , ELE PEGOU TUDO ANDANDO, ARRUMAR VAI SER DIFICIL , RODOANEL NORTE ,ESTAÇÃO VILA SONIA 15 ANOS PARA SER CONSTRUIDA , MONOTRILHO OURO LINHA 17 , LINHA LARANJA QUE PRECISOU ENTRAR A ACCIONA PARA DAR UM FOLEGO , ESSE É O GOVERNO DO PSDB, QUE MARAVILHA , QUEM CONHECE DÊ OPINIOES QUE AJUDEM .

  9. perfeito. seu artigo foi perfeito.

    e é constrangedor, para não dizer um assédio moral, o trabalhador ter que trabalhar emprestado, passar seu know-how com o risco de ser demitido ao final do processo. isso é de uma malvadeza sem dó. por isso esse processo não pode ir adiante. Tarcísio se mostrou a que veio.

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