A ViaMobilidade, operadora das linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda, está utilizando uma técnica curiosa para a manutenção de suas vias. A pintura de trilhos com tinta branca é uma das soluções encontradas para a resolução dos problemas de flambagem.
A ação pode parecer irracional aos olhos leigos. Mostraremos de forma detalhada como de fato essa pintura pode gerar bons resultados.
![Pintura de via utilizando um veiculo rodoferroviário (Jean Carlos)](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/IMG_9412-Jean-Carlos.jpg)
Do que é feito o trilho
O primeiro passo é entender do que é feito um trilho. As barras metálicas não são simplesmente lingotes de ferro qualquer. Elas são formadas por aço carbono.
O aço carbono dos trilhos padrão SS (Standard Strength / Resistência Padrão) é composto por ferro e a adição de materiais como manganês, carbono e silício. A soma desses elementos confere maior resistência.
![Composição química do trilho (CPTM)](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/Trilho.jpg)
Mais do que isso, a composição do aço dos trilhos ameniza o efeito de dilatação térmica. Vamos explicar o que é este efeito.
Dilatação térmica
A dilatação térmica é um efeito físico que ocorre quando os materiais passam por uma mudança de temperatura. Quanto maior a temperatura, maior será a agitação das moléculas e seu efeito prático será a expansão dos materiais.
Os metais em especial sofrem consideravelmente com os efeitos da dilatação térmica. Em pequenos objetos é praticamente imperceptível, mas quanto maiores as dimensões, mais visível torna-se esse efeito.
Os trilhos ferroviários são o melhor exemplo de elemento que sofre com a dilatação térmica. Por estarem instalados ao longo de dezenas de quilômetros, a variação de temperatura pode aumentar consideravelmente a extensão das barras metálicas.
A dilatação térmica do aço é de 1,1 x 10-5/°C. Para exemplificar, pensemos em uma barra de 1.000 metros de trilhos. Quando a temperatura aumenta em 1°C o trilho tem uma dilatação de 1,1 centímetro.
![Coeficiente de dilatação do Aço em relação a outros materiais](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/675d608f38127ff6c8109e810e6ce9ce.jpg)
A flambagem
A dilatação de 1,1 centímetro com a variação de 1°C de temperatura parece ser até cômica observando a dimensão da barra de aço como um todo. Mas não se engane. Esse efeito é exponencial, seja com o comprimento total dos trilhos ou com as temperaturas.
O grande problema da expansão acentuada dos trilhos é o aumento da compressão que a dilatação exerce nas barras metálicas. Os trilhos são soldados uns aos outros e unidos por juntas mecânicas em alguns pontos.
Quando as forças lineares no trilho excedem determinado limite ocorre o efeito de flambagem. Para aliviar as forças internas o trilho se deforma, modificando completamente a geometria de via.
![Flambagem em via](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/1709482393695.jpg)
Com a geometria (formato da via) alterado os trens são obrigados a trafegar com velocidade reduzida ou até mesmo não trafegar sob risco de descarrilamento.
Nos períodos de calor a variação térmica nos trilhos pode chegar a até 20°C. Utilizemos como exemplo o trecho entre Lapa e Barra Funda com 3,2 km de extensão.
Se um trilho com 3.200 metros for submetido a uma variação de temperatura superior à 20°C a dilatação térmica fará com que ele se prolongue em 70 centímetros.
Pintura: Uma solução diferenciada
Diante dos efeitos complexos da dilatação a ViaMobilidade optou por uma solução de fácil implantação: A pintura dos trilhos.
Antes de tudo é preciso explicar como esse processo ocorre. A pintura dos trilhos é feita através de um caminhão rodoferroviário adaptado com um compressor e quatro sprays que jateiam a tinta na lateral dos trilhos.
![Jateamento de tinta nos trilhos (Jean Carlos)](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/IMG_9405-Jean-Carlos.jpg)
O mecanismo que permite a pintura foi totalmente elaborado pelas equipes da ViaMobilidade. A concessionária até tentou encontrar empresas que prestassem o serviço, sem sucesso, o que obrigou o desenvolvimento de uma solução interna.
A pintura ocorre com o veículo em movimento. A velocidade de aplicação é de 5km/h e geralmente são utilizadas duas demãos de tinta, uma na ida e outra na volta do veiculo.
São pintados as áreas correspondentes a alma e o patim do trilho. Estas são as partes central e inferior do trilho. O boleto, parte superior, não é pintado para evitar problemas de aderência do veículo durante o processo de pintura.
![Jateamento de tinta nos trilhos (Jean Carlos)](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/IMG_9445-Jean-Carlos.jpg)
Reflexão da Luz
O efeito físico que proporciona o alívio da temperatura é a reflexão da luz. Em objetos escuros toda a luz é absorvida, aumentando a temperatura e o efeito de expansão térmica.
Quando os trilhos são pintados de branco parte considerável da luz é refletida, minimizando a absorção da energia luminosa e da temperatura dos trilhos.
Em medições realizadas pelas equipes da ViaMobilidade foi constatado que a diferença de temperatura entre trilhos pintados e não pintados pode chegar a até 7°C.
![Efeito de absorção da luz](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/Absorcao.jpg)
Metas e conclusão
A meta da ViaMobilidade é realizar a pintura de 8 quilômetros de trilhos até fevereiro. A maioria dos trechos está localizado na Linha 8-Diamante, local que possui mais curvas, foco principal das pinturas.
A tinta utilizada é a base de água, ou seja, não possui nenhum efeito nocivo ao meio ambiente, eliminando as preocupações com contaminações.
![Tinta utilizada é a base de água e não polui o ambiente (Jean Carlos)](https://www.metrocptm.com.br/wp-content/uploads/2025/02/IMG_9430-Jean-Carlos.jpg)
Até agora, nenhum local que foi pintado com a nova técnica sofreu qualquer tipo de efeito de flambagem. A diminuição da temperatura é uma das principais soluções para evitar a expansão descontrolada durante o período do verão.
O novo procedimento deverá ainda passar por um veredito final. Será feito um acompanhamento da solução durante todo o verão para atestar a eficácia plena do método.
Caso se mostre realmente eficaz, a técnica de baixo custo operacional deverá minimizar as falhas de via que geralmente causam lentidão e impactam diretamente na viagem dos passageiros.
Engenharia simples e funcional, parabéns aos idealizadores.
Parabéns pela matéria. Está muito bem explicada.
Parece uma boa e engenhosa iniciativa. Seus custos parecem menores que seus benefícios. Vale a pena fazer.
Não resolve todos os casos, mas ajuda.
Achei interessante a solução, porém, imagino que a face superior dos trilhos deve ser a que mais absorve calor. Como a pintura é feita nas faces laterais da alma, não enxergo uma eficiência tão grande.
Não entendo muito de trilhos, mas imagino que devem ter juntas de dilatação a cada x quilometros. Porque não se aumenta a quantidade de juntas de dilatação?
A face superior não precisa ser pintada já que vai ficar em contato direto com o trilho e pode gerar mais problemas do que diminuir os atuais, não precisa aumentar as juntas, já que a dilatação é irrisória em relação a distância de cada junta e a tinta não está sendo feito em todo o trecho, somente em trechos que podem sofrer com mais com flambagem, que geralmente são as curvas no trecho.
Se não pode pintar a parte superior dos trilhos (os boletos), então, por que não fazem um polimento?
Isso também refletiria a luz.
Ultimamente, tenho visto que os trilhos não têm mais aquele acabamento brilhoso por cima deles.
Eu achava que fosse norma padrão até porque isso também ajuda a reduzir a resistência ao atrito e tornar mais eficiente a movimentação dos trens.
O polimento é mais para garantir que o trem não descarrilhe do que manter o trilho mais frio.