Após um ano difícil, com prejuízo acima de R$ 1,7 bilhão, seria de esperar que o Metrô de São Paulo buscasse metas mais realistas, porém, o plano de negócios da companhia, divulgado nesta quarta-feira (10), traz objetivos complicados de serem atingidos em meio à algumas promessas mais factíveis.
A divulgação do documento contou com uma entrevista ao vivo do presidente do Metrô, Silvani Pereira, que justificou sua ausência durante o evento de início das obras de readequação da estação Vila Prudente por estar na capital federal – o executivo foi alvo de especulações no fim de semana de que será substituído por um delegado da polícia federal, o que não foi confirmado pelo secretário Alexandre Baldy.
Confira a seguir algumas das principais metas do plano e nosso comentário:
Atingir receita não-tarifária de R$ 330 milhões
O Metrô tem apostado em vários projetos para tentar ampliar o faturamento que não envolva o transporte de passageiros como publicidade, locação de espaços e outros, mas também esse tipo de receita é afetado pela queda na demanda. Em 2020, por exemplo, o valor obtido foi de apenas R$ 166,8 milhões, o que leva a crer que a meta de dobrar esse montante este ano seja praticamente impossível.
Reduzir despesas com bilhetagem e custeio
Com a adoção do QR Code, a empresa pretende economizar com custos de bilhetagem até R$ 14,2 milhões durante o ano. Isso envolve a redução na produção e manuseio dos bilhetes Edmonson, uma tecnologia cara e hoje de baixa demanda. Além disso, o Metrô pretende reduzir em R$ 15,7% os custos gerais, que foram de R$ 265 milhões no ano passado.
Iniciar operação comercial do CBTC nas linhas 1-Azul e 3-Vermelha
Antes previsto para ocorrer em fevereiro e julho, o projeto do CBTC atrasou mais uma vez e está em reprogramação. Apesar disso, é bastante improvável que o Metrô consiga colocar ambos em funcionamento se não houve até hoje um teste em horário comercial. Já instalar as portas de plataformas nas estações Jabaquara, Tucuruvi, Palmeiras-Barra Funda e Corinthians-Itaquera, parte do mesmo contrato, parece viável.
Iniciar as obras para segregação das vias das Linhas 1, 2 e 3
O item era desconhecido por este site até hoje e não está explicado no documento do Metrô. De fato, atualmente as três linhas mais antigas são interligadas para compartilhamento de trens e serviços, mas a perspectiva de uma possível concessão da Linha 2-Verde pode explicar a meta.
Publicar o edital para aquisição de 44 trens
Nesta semana, o secretário Alexandre Baldy afirmou que a licitação de 44 trens deve ocorrer em breve. Essas composições não só servirão para reforçar as linhas 1, 2 e 3, mas também substituir os 11 trens da Frota E, a única do Metrô a não contar com ar-condicionado. A informação foi revelada por Silvani durante a entrevista e mostra que a atual gestão não cogita lançar um projeto de modernização nos moldes da Frota A.
Contratar infraestrutura de monitoramento de estações e implantar CCM
Silvani já havia dito em outras ocasiões que o Metrô ambiciona criar uma infraestrutura que monitore em tempo real as estações, túneis e trens para reduzir problemas na operação. Além disso, a companhia pretende implantar um Centro de Controle de Manutenção neste ano.
Expansão
Linha 2-Verde
Segundo o plano, a meta é concluir 2021 com 80% do poço Falchi Gianini pronto, obra mais próxima da estação Vila Prudente e de onde será feita uma escavação em método NATM até lá. Além disso, o Metrô pretende executar 50% da parede diafragma da vala do Complexo Rapadura.
Eis aí um indício de que a extensão da Linha 2 até Penha deve atrasar. A meta, mesmo que atingida, significa dizer que o shield que escavará os túneis ainda terá de aguardar a conclusão do poço para começar a ser montado no Rapadura. O problema é que o impasse em relação à praça onde será feito o canteiro persiste, sem vislumbrar uma solução a curto prazo.
Linha 4-Amarela
As metas da Linha 4 são bastante promissoras, a entrega de Vila Sônia, do terminal de ônibus, túneis e poços. Além disso, o Metrô espera assinar o contrato das obras do novo túnel de ligação entre as estações Consolação e Paulista.
Linha 5-Lilás
Aqui não há novidade: o Metrô esperar concluir a instalação das portas de plataformas que faltam até o final de 2021. Os trabalhos estão evoluindo em bom ritmo e cinco dessas estações devem contar com as PSDs a partir do mês que vem.
Linha 15-Prata
O monotrilho da Zona Leste deverá contar com a estação Jardim Colonial, mas outras frentes de trabalho não foram citadas no plano, como a contratação das obras de duas novas estações, a extensão de vias nas pontas do ramal e a licitação da futura estação Ipiranga, que foi citada por Baldy nesta semana.
Linha 17-Ouro
Na parte civil, o Metrô espera instalar a cobertura do prédio principal do pátio Água Espraiada e instalar o bandejamento no trecho Congonhas-Campo Belo apenas. Estranha-se essa meta já que a Coesa tem prazos curtos e muitas vigas-trilho ainda a serem lançadas.
Já na parte de sistemas, a meta é modesta: aprovar o projeto executivo do monotrilho da BYD SkyRail, que teria apenas cerca de um ano para entregar o primeiro trem pronto, segundo comentou Baldy recentemente. O problema é que o contrato está parado novamente por conta de uma liminar na Justiça.
Linha 16-Violeta
Revelada em primeira mão pelo site, a Linha 16 deve ter o projeto diretriz concluído neste ano. Ela irá de Itaquera até a estação Oscar Freire, segundo mapas divulgados pela empresa.
Linha 19-Celeste
A meta da Linha 19 está atrasada. Trata-se da assinatura do contrato para o projeto básico do ramal, que deveria ter ocorrido em 2020, mas foi barrado pelo TCE.
Linha 20-Rosa
O Metrô espera contar com subsídios técnicos para concluir as alternativas para o anteprojeto de engenharia do ramal, que teve contrato assinado há poucos meses.
Na entrevista, Silvani revelou algumas informações bem interessantes. O presidente disse que a área de projetos da companhia conseguiu reduzir em 15 a 20% os custos de implantação das estações da Linha 20, comparados ao projeto da Linha 5. Um dos aspectos estudados envolve estações menos profundas, que acabariam exigindo intervenções mais simples e baratas. Como o Metrô evitaria interferências no subsolo, argumento usado para projetos tão profundos, não se sabe, no entanto.
O metrô de São Paulo, assim como as redes de outras grandes cidades brasileiras, precisam de financiamento robusto e estável ao longo dos anos para poderem crescer mais rapidamente. A iniciativa privada só entrará investindo se a taxa de retorno for atraente e, para isso ocorrer, precisa de uma boa contrapartida pública. Veja o caso da linha 4 do metrô de SP, em que apenas 27% dos recursos vieram da iniciativa privada. Isso para uma linha de grande demanda e com cortes significativos de gastos em estações, eliminando algumas do projeto inicial. A linha 20-rosa projetada pelo metrô também se assemelha ao caso da linha 4. O grupo inglês, interessado em construir o ramal, afirma que pode fazer com 100% dos recursos apenas o trecho entre Santa Marina e Faria Lima. Os demais teriam que ter contrapartida estatal. Fora que ainda exigiram a concessão da linha 2, já “pronta” entre o trecho Penha e Vila Madalena e construiriam o trecho até a conexão com a linha 20( detalhe: um trecho de 2,6km com apenas uma estação adicional, o que vai contra a lógica de um transporte de alta capacidade em área adensada). Um outro fator é ver se a concessão vai ser favorável ao usuário, quanto ao número de estações também . No projeto da linha 4, por exemplo, havia 4 estações a mais do que o que foi feito efetivamente( estações Rio Branco, Maria Antônia, Brasil e Três poderes) Veja o metrô de Paris, por exemplo, com muito mais estações por linhas. Já eliminaram também umas 3 estações no projeto da linha rosa para torná-la mais atrativa à iniciativa privada. Nada contra a iniciativa privada querer lucro. É legítimo. Mas é legítimo também o usuário contar com mais opções de linhas e estações. Para viabilizar as duas coisas, somente com uma contrapartida estatal maior tanto para atrair mais investidores privados, pois o investimento em metrô é daqueles em que o retorno social é maior do que o retorno privado, inclusive considerando a tarifa a ser cobrada do usuário. Se fosse só pela lógica do lucro, a tarifa em SP, por exemplo teria que ser muita mais cara do que já é. Por isso , também exige-se contrapartida estatal também no funcionamento das linhas. O difícil é achar essas fontes de financiamento, que poderiam ser uma combinação de pedágio urbano, adicional do IPVA e imposto sobre combustíveis, mas com vinculação para a expansão de infraestrutura de transportes. Com os recursos do orçamento atuais não se dá para fazer grandes redes de metrô, pois existem demandas enormes em saúde, educação, segurança, assistência social e etc… ,principalmente num país com tanta desigualdade como o nosso. E ainda temos a dívida pública. Uma briga difícil.
Mas se precisa de toda essa contrapartida estatal, então nao precisa da iniciativa privada. Assim fica fácil.