Um voto contrário do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, a respeito da possibilidade de concessões públicas serem transferidas para novas empresas sem licitação fez o setor de infraestrutura entrar em pânico em agosto do ano passado.
Se fosse confirmada, a decisão causaria um turbilhão em inúmeros contratos de concessão que acabaram sendo repassados para outros grupos privados nos últimos anos, entre eles a Linha 6-Laranja, maior obra de infraestrutura do país.
Na semana passada, no entanto, após mudança de voto do relator, formou-se maioria pela manutenção da legalidade da transferência de concessões.
A matéria havia sido apreciada pelo STF após a Procuradoria-Geral da República ter entrado com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que questionava a permissão de venda da concessão sem nova licitação.
Dias Toffoli deu razão à alegação há sete meses e estipulou um prazo de dois anos para que os órgãos públicos revisassem os contratos que foram repassados para outras empresas. Ou seja, o voto atingia em cheio a Parceria Público-Privada (PPP) entre o Governo do Estado de São Paulo e a Acciona, construtora que assumiu o lugar da Move São Paulo em outubro de 2020.
A decisão de Toffoli causou uma enorme discussão no meio empresarial e em outras esferas de governo por gerar uma insegurança jurídica em inúmeros contratos e licitações.
A situação começou a mudar tempos depois quando o próprio Procurador-Geral da República, Augusto Aras, alterou seu entendimento. O plenário do Supremo voltou a analisar o caso em dezembro passado, com o relator confirmando seu novo voto.
A sessão só foi retomada a partir do dia 25 de fevereiro chegando à maioria de votos no dia 8 de março. Agora segundo Toffoli, “a transferência da concessão ou do controle societário não resulta de conluio para a transmissão da posição contratual a um concorrente; e, finalmente, não há indícios de cartelização”.
Dois ministros, Edson Fachin e Cármem Lúcia, no entanto, votaram pela proibição de transferência da concessão, mas já sem possibilidade de reverter o quadro.
Caducidade do contrato
O projeto da Linha 6-Laranja do Metrô teve a licitação originalmente vencida por um consórcio formado pelas empresas Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC, mas em 2016 a empresa formada por elas decidiu interromper as obras por falta de condições financeiras.
O governo do estado, na época comandado por Geraldo Alckmin (sem partido), tentou negociar com a empresa uma solução, mas diante do impasse decretou a caducidade do contrato, um instrumento jurídico que faria o projeto ser reiniciado quase do zero.
João Doria (PSDB), que sucedeu Alckmin em 2019, postergou o prazo de caducidade após analisar outras opções para viabilizar a retomada da obra. Depois de oferecer o projeto a vários grupos estrangeiros, a construtora espanhola Acciona chegou a acordo com os donos Move São Paulo e em outubro de 2020 a alteração do contrato de concessão foi assinada, com a entrada da LinhaUni, nova concessionária que irá operar o ramal.
Caso o STF tivesse votado por impedir a transferência de concessões, o contrato da Linha 6 poderia voltar para a Move São Paulo e o governo estadual teria que lançar uma nova licitação com efeitos imprevísiveis.
Por um lado essa regra de não precisar de uma nova licitação é boa, afinal a Linha Laranja ia estar até hoje parada provavelmente, ainda mais com a falta de dinheiro que a pandemia gerou na indústria do transporte.
Mas com a regra funcionando, a Acciona pode entrar.
Agora por outro lado, essa mesma regra permitiu a desativação do projeto da Linha Bronze e licitação sem concorrência ou contestação de um corredor de ônibus no lugar.
No caso da Linha 18, na minha humilde opinião leiga, a situação é totalmente diferente, já que objeto de concessão (monotrilho/ônibus) também mudou, embora o intuito de ambos seja o mesmo.