Tecnologia brasileira, Aeromovel é a proposta mais barata para o People Mover de Guarulhos

Sistema que usa propulsão pneumática foi oferecido como solução para levar os passageiros do aeroporto até a Linha 13-Jade da CPTM
O projeto do Aeromovel para o Aeroporto de Guarulhos (AeroGRU)

O termo “monotrilho” foi utilizado pelo governador João Doria (PSDB) quando anunciou uma solução para tornar o acesso ao Aeroporto de Guarulhos mais fácil para quem utiliza a Linha 13-Jade da CPTM. Mas, como já mostrou o site em outra ocasião, trata-se de uma generalização que não reflete as possibilidades analisadas para o chamado “people mover” que a GRU Airport, concessionária do aeroporto, deverá construir mediante um “desconto” em sua outorga anual.

Entre as propostas recebidas pela concessionária no começo do ano estão trens elétricos, puxados por cabos e com propulsão pneumática. Neste caso, trata-se de uma solução brasileira criada pelo engenheiro Oskar Coester, que chefiou a área de manutenção da Varig, antes de fundar a empresa que inventou o Aeromovel (sem acento, segundo ela). Ao contrário de seus concorrentes, o veículo brasileiro se move por meio da pressão fornecida por ventiladores estacionários, que é canalizada para um túnel no interior da viga que o suporta e move uma espécie de “vela” presa à parte inferior do trem. Com isso, cada vagão é muito leve, a metade do peso de um ônibus, por exemplo.

O Aeromovel também é mais barato que as tecnologias implantadas em outros aeroportos, garante Marcus Coester, filho de Oskar e que hoje está à frente da empresa. “O custo atual médio de implantação do Aeromovel em pista dupla, ou com ultrapassagem, é de US$ 20 milhões por quilômetro“, explicou ao site. Como comparação, a empresa cita o “people mover” fornecido pela Mitsubishi ao aeroporto de Tampa, na Flórida, cujo custo por quilômetro foi de US$ 183 milhões, nove vezes mais alto.

De fato, no leilão eletrônico realizado pela concessionária em janeiro, a proposta do consórcio AeroGRU, que inclui também as empresas HTB, FBS e TSEA, além da Aeromovel, foi considerada a mais barata. Embora a GRU Airport não tenha revelado detalhes, estima-se que até 10 empresas participaram dessa primeira rodada, entre elas a Doppelmayr, fabricante que ofereceu uma tecnologia por cabos. Em março, a coluna Painel S.A, da Folha de São Paulo, apontou a empresa austríaca como favorita na concorrência, mas sem apontar razões.

Proposto pela própria GRU Airport logo que assumiu a operação do maior aeroporto brasileiro, o “people mover” foi uma solução para o fato de a concessionária ter impedido que a Linha 13-Jade tivesse uma estação bem em frente ao terminal 2. Na época, o argumento da empresa foi de que a área escolhida pela CPTM seria usada para a construção de um shopping e um centro de convenções, porém, nada disso saiu do papel até hoje. Para fazer a ligação com os terminais, a GRU disponibiliza ônibus gratuitos.

Resgatado pela gestão Doria, o “people mover” prevê um serviço que passará pelos três terminais do aeroporto e terminará no acesso já construído para ele na estação Aeroporto Guarulhos. A proposta da AeroGRU, a que o site teve acesso, mostra uma composição de dois vagões que percorrerá uma via simples com pontos de ultrapassagens (chamados também de ‘bypass’).

Segundo Coester, “com esta técnica, o tempo mínimo entre viagens (headway) pode ser ajustado para menos de 6 minutos. A via simples é também uma característica necessária para acesso eficiente ao terminal dois, que é a parte mais complexa do projeto em função da estrutura e das interferências existentes. O projeto prevê uma estação adjacente ao terminal dois, que tem o maior fluxo de pessoas, facilitando assim o acesso dos passageiros ao APM (automated people mover). Com este traçado, a porta da estação se conecta diretamente ao prédio do terminal“.

A AeroGru também estima que o “people mover” de Guarulhos possa ser implantado em até 18 meses, conforme informou o governo do estado. O consórcio faz questão de ressaltar que 95% do sistema utiliza componentes nacionais, o que na sua visão evitaria efeitos negativos causados pelas restrições impostas pela pandemia do Covid-19.

O Cable Liner, da Doppelmayr, é outro dos cotados para Guarulhos (Divulgação)

Custo mais alto

A implantação do “people mover” no Aeroporto de Guarulhos está próxima de completar um ano de seu anúncio. Foi em 28 de maio do ano passado que o governador João Doria reuniu a imprensa para afirmar que um “monotrilho” faria a esperada ligação com a CPTM. Com custo estimado de R$ 175 milhões, o sistema teria suas obras iniciadas em setembro do ano passado e entrega prevista para maio de 2021, mas logo ficou claro que o otimismo do tucano não encontrava bases reais.

A razão para isso é simples: a parte que cabe ao governo do estado é apenas a de consultoria do projeto já que os recursos virão do governo federal por meio de uma alteração contratual na concessão de Guarulhos. Esse processo não é simples e agora ainda conta com as picunhas entre Doria e Bolsonaro para criar possíveis dificuldades, embora o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, sempre tenha se mostrado interessado em resolver o problema.

A questão é que a estimativa de custo do projeto parece aquém do que se vislumbra pelos dados fornecidos pela AeroGRU. Segundo ela, um sistema de “people mover” por cabos implantado na Califórnia em 2014 teve um custo por quilômetro de US$ 94 milhões, ou cerca de R$ 520 milhões no câmbio atual. Como a linha de Guarulhos terá 2,6 km estamos falando de um investimento de quase R$ 1,4 bilhão. Mesmo o Aeromovel custando bem menos, significaria um montante de US$ 52 milhões ou R$ 290 milhões.

O traçado do people mover da GRU Airport

Poucos clientes

Caso o projeto se concretize e a AeroGRU seja escolhida, será sem dúvida alguma a maior exposição que o Aeromovel terá em sua longa carreira, iniciada nos anos 70. Até hoje apenas duas linhas estão em operação, a primeira na Indonésia, dentro de um parque temático com quatro estações e traçado circular, e no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre.

O “people mover” gaúcho foi inaugurado em 2013 e funciona com duas composições, uma de vagão simples e outra com dois carros. Eles fazem a ligação do aeroporto aos trens da Trensurb e tem a viagem de menos de um quilômetro cobrada. Além desses dois casos, a tecnologia criada por Oskar Coester teve uma linha de testes erguida na capital do estado, na região do Gasômetro, porém, que funcionou em raras ocasiões. Após quatro décadas, o trem depredado que jazia na via foi retirado pela prefeitura de Porto Alegre.

Questionado por que o Aeromovel não encontrou mais interessados em todos esses anos, Marcus Coester reconhece que não existe uma resposta pontual para isso. “O Aeromovel é, hoje, uma tecnologia madura que se submete às melhores práticas internacionais de engenharia. A confiabilidade, a segurança, a eficiência energética e o custo do sistema estão amplamente demonstrados em centenas de estudos internacionais, além das aplicações práticas em Jacarta e Porto Alegre“, explica.

O Aeromovel de Jacarta, na Indonesia (Aerom)

Assim como qualquer outra tecnologia contemporânea, o Aeromovel está em constante evolução. A mais recente linha de Porto Alegre introduziu uma série de funcionalidades e novas tecnologias como a sincronia de portas nas estações, comunicação por rádio entre o veículo e a estação, além do controle contínuo dos propulsores, que anteriormente tinham controle discreto. O principal marco da linha do Aeroporto de Porto Alegre, no entanto, é a comprovação da eficiência energética em um regime de operação metroviária (19h por dia, 7 dias por semana) e a confiabilidade dos componentes neste regime (disponibilidade média acima de de 99,6%)“, completa.

O CEO da Aerom também garante que a tecnologia tem se tornado mais conhecida no mundo: “O sistema de Porto Alegre abriu as portas do Aeromovel em diversos projetos internacionais, tanto de sistemas de trânsito urbano como de people movers de aeroportos. Atualmente, o pipeline contempla mais de 100 oportunidades ou projetos em mais de 20 países“, afirma.

Coester, no entanto, lamenta as dificuldades enfrentadas com a administração pública, que geralmente apresentam “inconsistências e inconstâncias” além das turbulências econômicas comuns. De fato, o Aeromovel passou por algo nesse sentido em anos recentes quando teve um projeto contratado pela prefeitura de Pelotas, mas que foi descartado pela gestão seguinte. Nesse sentido, o projeto do Aeroporto de Guarulhos, com seu impasse de quase uma década, não parece ser muito diferente.

Tecnologia de propulsão pneumática do Aeromovel foi criada por engenheiro brasileiro (Aerom)

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  1. Infelizmente agora acho muito difícil esse projeto sair do papel.
    Muito provavelmente o governo federal não repassará o dinheiro pois vai alegar que o mesmo será mais útil de outra forma mediante à crise que está por vir.

    1. nao havia necessidade nenhuma de concessão de aeroportos. a infraero era superavitaria, e se havia problemas de infraestrutura no aeroporto, era mais facil abrir linha de credito para infraero que conceder. até porque o dinheiro da outorga das concessionarias vem do BNDES. se der lucro, ok. se não der resultado positivo, eles devolvem pro governo.

      com isso a linha do trem que deveria parar no terminal 2, foi parar lá do outro da estrada. tudo porque no contrato de concessao, a exploraçao do local cabe a concessionaria, e onde seria a estaçao, há um projeto de um shopping.

      mas isso é Brasil. aqui se o cachorro tem pulgas, vc mata o cachorro para matar as pulgas.

  2. acho esse projeto mais interessante que o do Doppelmayr, que já foi mostrado aqui tambem neste site.

  3. O nome da cidade onde o novo prefeito deu uma rasteira no Aeromóvel está errado, foi em Canoas.

    Fico na torcida para que o Aeromóvel vença a concorrência no aeroporto internacional de Guarulhos, seria uma vitrine muito melhor para ele.
    Há vídeos até que recentes no YouTube sobre a linha no parque Taman Mini em Jacarta, continua funcionando bem até hoje, os trens não estão mais em cores brasileiras, deram uma envelopada neles para atualizá-los.

  4. Por mais que goste da tecnologia ser nacional, o conceito do aeromóvel não seria um exemplo de “overengineering”? Digo, qual é a necessidade de construir uma viga oca, e ventilar por dentro, sendo que um pequeno VLT faria o mesmo trabalho, afinal seria necessário apenas uma viga dois trilhos e um trilho alimentador. Enfim, espero que construam logo independente do modelo.

    1. Guilherme, pelo que andei lendo a respeito o aeromóvel retira o motor de dentro do trem para deixá-lo mais leve, consumindo menos energia. As vigas para um VLT em geral são ocas também, só que mais pesadas por causa do trem.

  5. Alguém já viu um cálculo de eficiência energética deste aerotrem ?
    Já fiz uma visita em Porto Alegre e achei bem fraquinho tecnicamente e olhe que tenho mais de 40 anos de experiência na área metro ferroviaria
    Tanto tempo no mercado e não conseguiu vender quase nada ..
    Muito papo furado e pouca engenharia
    Sai fora que é cilada …

  6. O aeromóvel fracassou em Porto Alegre por falta de suporte da empresa Aeromóvel S/A. Ela vendeu 2 veículos para a operadora do metrô local (Trensurb). Desde 2017 o maior dos veículos aeromóveis está parado por falta de peças e assistência técnica do fabricante (a fabricante das peças, a T’Trans, está em recuperação judicial).

    Se esse projeto não deu conta de Porto Alegre, nunca irá dar conta do maior aeroporto do país. Não embarquem nesse “patriotismo” de fachada. A sociedade brasileira não deve aceitar produtos de má qualidade apenas por serem projetados/fabricados aqui.

    1. Prezado Ivo,

      A Aeromovel não vendeu dois veículos, foi a T’Trans de forma independente. A indisponibilidade do A-200 é por conta de uma bolsa de ar que precisa ser substituída, uma manutenção trivial que não tem nada a ver com a tecnologia em si. O fato de não ter sido ainda substituída está relacionada com questões contratuais com a fornecedora.

      Os índices de disponibilidade global do sistema no Aeroporto Salgado Filho são surpreendentes para um APM de via simples que opera 19 h por dia, sete dias por semana, mesmo com essa temporária indisponibilidade do veículo. Na verdade, ela atesta a robustez do sistema como um todo.

      Prezado Luiz,

      É perfeitamente compreensível a impressão de que um veículo movido a ar não é eficiente, pois parece contraintuitivo. Especialmente se pensamos em sistemas de transporte pneumático de grãos para navios, por exemplo, sabidamente mais intensivos em consumo. No entanto, não estamos falando de kWh/kg, mas sim kWh/passageiro.

      No entanto, o veículo pesa de duas a três vezes menos que um VLT. Ele teria que ser de duas a três vezes menos eficiente para se quer empatar em eficiência, grosso modo. O sistema é muito vantajoso em aplicações em que haja uma distância entre estações em torno de 750 m, na qual 90% da energia é gasta na aceleração do veículo, que é impactada na proporção direta pela massa da composição. Um ventilador industrial centrífugo aerofólico tem rendimento total (estático e dinâmico) máximo em torno de 86%. Considerando a utilização de variador de frequência é possível manter-se na zona de máxima eficiência durante boa parte do trajeto, resultando em um rendimento médio realístico do propulsor de aproximadamente 70%. As irreversibilidades termodinâmicas resultantes da perda de carga distribuída ao longo do trecho entre estações está relacionada ao quadrado da velocidade e linearmente à distância. Para as velocidades praticadas em sistemas urbanos (entre 45 km/h e 80 km/h) e os comprimentos referidos, ela se torna pouco significativa. A 80 km/h, na fase de cruzeiro, pior caso, ela pode atingir 0,36 mmCA/m. O consumo médio do aeromóvel é de 19 Wh/lugar.km. Ele tem uma característica interessante decorrente do baixo do veículo que é o desempenho excepcional no período de vale (70% do tempo de operação de um sistema de transporte) onde o carregamento médio é de apenas 30% do total. Logo é possível manter um headway atrativo mesmo nas horas de baixa demanda.

      Esses dados são atestados por uma série de estudos, pareceres, laudos, dissertações de mestrado e teses de doutorado de instituições como UFRGS, PUCRS, IME, Consultorias Internacionais e empresas privadas nacionais e multinacionais.

      Temos que acreditar que nosso país é capaz de produzir engenharia de boa qualidade, vide exemplo da Embraer.

  7. Uma vez que esta linha 13-Jade não seguira sem transbordo para conforto dos usuários com configuração ideal semelhante ao foi executado na Estação Rodoviária do Tiete da Linha 1-Azul até os terminais 1, 2 e 3 do aeroporto, a forma melhor será feita por ônibus circular, semelhante ao que acontece hoje, planejando e priorizando a extensão da Linha 13-Jade até uma localidade estratégica no município de Guarulhos que possui uma grande demanda reprimida, ficando a Estação Aeroporto como uma estação de passagem.

    “Segundo dois ex-secretários de transportes metropolitanos do estado Jurandir Fernandes e Clodoaldo Pelissioni o projeto original previa que a estação Aeroporto fosse localizada na entrada do terminal 2, mas reverteu quando o consórcio vencedor para administrar o terminal, a GRU Airport, informou na época que o local destinado à estação de trem deveria ser usado para um shopping…”
    (Esta informação confirmou que o projeto inicial da CPTM previa a chegada até o terminal 2 , e só não foi feita pela falha no contrato de concessão, e não até o município de Guarulhos, cuja a mudança de terminal só foi feita após constatado o fracasso da baixa demanda da linha, e para confirmar que Guarulhos não estava previsto no projeto inicial, é que as novas composições a serem adquiridas possuem características únicas para bagageiros).
    “A empresa teria se comprometido em construir um monotrilho entre a estação de trem e os movimentados terminais 2 e 3.”
    (Esta outra informação confirmou que o tratado com a GRU Airport inicial previa a chegada até os terminais 2 e 3 excluindo o 1 e sem se demolir nada).

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